terça-feira, 15 de junho de 2010

Josias de Souza montou dossiê contra tucano com documentos da Receita Federal

Auditores da Corregedoria da Receita Federal apreendem correspondência eletrônica que reaviva caso

Em carta, EJ conta como "protegeu" as suas empresas

JOSIAS DE SOUZA - São Paulo, domingo, 28 de setembro de 2003
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Documentos apreendidos por auditores da Receita Federal em escritórios de Brasília, Porto Alegre e Rio de Janeiro expõem detalhes da tática adotada por Eduardo Jorge Caldas Pereira para "proteger" os seus negócios da curiosidade do Fisco e do Ministério Público.

Há dois meses, numa mensagem eletrônica enviada a seus sócios, Eduardo Jorge anotou que "os procedimentos de isolamento" implementados três anos atrás "já não fazem sentido".

Investigado desde 2000 por suposto enriquecimento ilícito, falava da "perspectiva de solução final" da "crise". Nada havia sido comprovado.

Quando escreveu aos sócios, às 11h30 do último dia 29 de julho, o ex-secretário-geral da Presidência da República (gestão FHC) não imaginava o que ocorreria dali a 39 dias. Apreendido por auditores da Corregedoria da Receita, o texto de seu e-mail reavivou o chamado caso EJ, uma tormenta que supunha encerrada.
Na última segunda-feira, em ofício à Justiça, o Fisco informou ter enxergado na correspondência eletrônica do ex-secretário-geral "indício de fraude contábil e fiscal". Na correspondência eletrônica retida pela Receita, Eduardo Jorge menciona empresas até então desconhecidas dos investigadores. Fala de acordos negociais. Sugere a elaboração de contrato informal. Discorre sobre "dívidas" e "créditos".
Eduardo Jorge reage com indignação à nova investida do Fisco: "Trata-se de uma armação. Estão procurando chifre em cabeça de jumento". Seu calvário recomeçou na noite do dia 27 de agosto.

"Pressões"

Em depoimento à Corregedoria da Receita, o auditor Ruben de Seixas Neto denunciou supostas pressões que teria recebido da cúpula da Receita para "concluir rapidamente e sem resultados" uma fiscalização sobre EJ.

Seixas Neto repetiu a acusação perante o Ministério Público. Foi imitado pela auditora Rosa de Oliveira, sua parceira na fiscalização. Conforme revelou a Folha na edição do sábado passado, documentos internos da Receita põem em xeque a imputação dos fiscais.

As alegadas "pressões" seguem pendentes de comprovação. O que não impediu a Corregedoria da Receita de realizar, em 5 de setembro, diligência para confiscar papéis nos escritórios de empresas que têm EJ como cotista.

Foi nessa operação que o e-mail de EJ foi apreendido, junto com papéis que recheiam mais de cem caixas. Encontram-se lacradas em Brasília, por ordem judicial resultante de ação movida por advogado das empresas.

Antes que a ordem chegasse aos escritórios da Receita, uma equipe de auditores pôde analisar o conteúdo de duas caixas. Além da mensagem eletrônica, manusearam-se outras duas correspondências de EJ.

Ambas foram endereçadas aos sócios dele no Grupo Meta, composto de duas firmas -a Metaplan, de planejamento empresarial, e a Metacor (seguros).

Em uma das correspondências, de 30 de agosto de 2000, EJ formaliza o seu "afastamento" do conselho consultivo do Grupo Meta. Alega que o "intenso processo de denúncias" a que vinha sendo submetido o forçava a dedicar-se exclusivamente à sua defesa. A fiscalização do Fisco fora iniciada em 4 de agosto de 2000.

Na outra correspondência, de 4 de setembro de 2000, EJ formaliza os "acordos verbais" que celebrara com os sócios Ivan Carlos Machado de Aragão, Eduardo São Clemente D'Azevedo Neto e Cláudio Haidamus. O documento informa o seguinte:
1) em 1º de abril de 1999, EJ recebeu "gratuitamente" 10% das cotas da Metaplan e da Metacor. Ganhou naquele mesmo ano R$ 352 mil em dividendos;

2) no primeiro semestre de 2000, quando "foram distribuídos lucros referentes aos terceiro e quarto trimestres de 99", EJ recebeu mais R$ 903.723,88. Importância que excedia ao que lhe caberia de acordo com sua participação acionária, classificada no documento como uma "distribuição de lucros desproporcionais";
3) em julho de 2000, EJ recebeu novos dividendos: R$ 28.728,34;

4) Afora a distribuição de lucros, a Meta pagou a EJ em 99 mais R$ 160 mil. São honorários por serviços que, segundo o texto da carta, foram prestados por uma consultoria de sua propriedade, a EPJ;

5) EJ assumiu com os sócios o compromisso de "compensar" os R$ 903,7 mil auferidos na "distribuição de lucros desproporcionais" em partilhas futuras de lucros. Algo que não ocorreu até hoje;

6) a carta de EJ converteu-se numa espécie de contrato. Foi assinada pelos demais sócios. O espaço reservado à assinatura de Eduardo São Clemente D'Azevedo ficou em branco. O sócio não rubricou o papel.

"Acerto do passado"

Dos três documentos apreendidos pela Receita, o que mais chamou a atenção dos auditores foi o e-mail datado de 29 de julho deste ano. Na mensagem eletrônica, EJ busca repactuar as condições expostas nas duas correspondências que o Fisco apreendeu e que datam de 2000.

No e-mail, EJ chama a repactuação de "encaminhamento de acerto do passado". Foi discutida em reunião com os sócios, conforme explicitado no cabeçalho: "itens para pauta de nossa reunião de hoje", 29 de julho de 2003.

"O que fazer com o documento assinado, lá atrás, e que se destinava a proteger a Meta de especulações?", indaga EJ no texto da mensagem eletrônica. "Como eliminá-lo? É necessário o distrato. ESC [Eduardo São Clemente, o sócio que não assinou o acordo], como um dos signatários (e detentor de uma cópia), deve participar desse eventual distrato ou basta rasgarmos o documento? Como e quando fazê-lo?"

A correspondência eletrônica de EJ menciona também a necessidade de promover o "descruzamento" entre o Grupo Meta e uma firma desconhecida do Fisco. Chama-se Alleanza. Foi aberta no calor das investigações do caso EJ. Recebeu do Grupo Meta parte da carteira de clientes de seguros.

Embora não seja sócio da Alleanza, EJ é de fato o único responsável pelo faturamento da empresa. Ele diz no e-mail: "Se se considerar que praticamente 100% da receita da Alleanza é proveniente de clientes suportados por mim, eu acharia, em princípio, que deveríamos achar uma forma de equilibrar as coisas."

O ex-secretário cita ainda na mensagem digital outra firma ignorada pelo Fisco, a VML. Sobre essa empresa, ele diz no texto: "Não estaria na hora de formalizar as participações [na VML]? Seja no próprio contrato social ou -se se julgar que ainda existem riscos- num contrato entre nós?" Para o Fisco, trata-se de contrato de gaveta.

De novo, EJ não compõe o quadro de sócios da VML, outra firma de seguros. Mas fala aos sócios como se tivesse participação ativa. Menciona até mesmo negócios em andamento.Aqui para assinantes

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