domingo, 25 de outubro de 2009

Aécio se diz traído pela direção do PSDB'

Dilma Rousseff despendeu meses lutando contra um câncer, teve que ajudar o presidente Lula a defender publicamente José Sarney, e ainda enfrentou o constrangimento de ser acusada de mentirosa e prevaricadora por Lina Vieira, ex-secretária da Receita Federal, e pela oposição. Recolhida, perdeu alguns pontos na última pesquisa de intenção de voto, embora já tivesse crescido de 3% para 20% desde o ano passado.

José Serra não precisou enfrentar nenhuma crise nacional, apareceu nos jornais sempre que precisou, sumiu das páginas quando julgou necessário, assistiu em posição confortável às dificuldades da adversária e, embora também tenha perdido alguns pontos percentuais na última pesquisa, continua com mais do que o dobro das intenções de voto de Dilma.

Nestas circunstâncias, é muito melhor ser Serra do que Dilma, certo? Não necessariamente, por incrível que pareça.

O PSDB deve ser o único partido do mundo que entra em crise com pesquisa a favor. Nesta sexta-feira, o governador Aécio Neves, que disputa com Serra a indicação tucana para concorrer à Presidência, nem se esforçou para esconder da imprensa a indignação com a direção nacional, que mandou o Ibope fazer mais uma de suas pesquisas heterodoxas.

Nesta, pela primeira vez, submeteu ao entrevistado uma cartela com os nomes dos candidatos e dos possíveis companheiros de chapa. Seria apenas mais uma insólita novidade, não fosse pelo fato de que Aécio foi escolhido para aparecer na cartela como vice de Serra, hipótese que tira do sério o governador de Minas e seus seguidores.

Aécio acusou a direção nacional do PSDB de traição. A cúpula disse que não sabia de nada, porque a pesquisa teria sido encomendada por um tucano carioca exibido, que não consultou ninguém. Serra, na moita, gostou do resultado. Ele teria 41% dos votos contra 17% de Dilma, que ultrapassou novamente Ciro Gomes e reocupou o segundo lugar, ainda que dentro do limite da margem de erro.

O episódio demonstra que a aliança oposicionista vive um momento difícil. A um ano da eleição, reaparecem divergências que costumam rachar o PSDB no caminho das urnas e que estavam represadas pela permanência da crise no lado governista. Bastou que o vendaval virasse vento e que Dilma conseguisse inverter a situação, tornando-se protagonista de articulações políticas que atraíram para o seu ninho quase uma dúzia de partidos e, com eles, o dobro do tempo do adversário no horário gratuito na televisão.

Tucanos e democratas, do alto de seus supostos 40%, caíram em angústia, sofrimento e cava depressão. Alguns desabam em letargia, outros se tornam histéricos. Rodrigo Maia, presidente nacional do DEM, fazia lembrar um enlouquecido comissário Dreifuss sob o jugo do estabanado inspetor Closeau na série de filmes da Pantera Cor de Rosa. Desistiu de esconder que Aécio Neves é o candidato preferido dele e da maioria do DEM e fez saber aos tucanos que a hesitação de Serra pode levá-los a nova derrota e, no caso do ex-PFL, à ameaça de extinção.

O jovem democrata acordou a até então reprimida irritação tucana. Aécio cobrou a realização de um encontro da direção nacional do partido com ele e com Serra. Bastou uma mesa para quatro ocupada por apenas três pessoas – Aécio, Fernando Henrique e Sérgio Guerra. Serra, mesmo estando em São Paulo, participou por telefone – “mas era pelo viva-voz”, garantem os grão-tucanos.

Não podia dar certo. Aécio deu um ultimato ao partido. “Em dezembro, vou cuidar da minha vida”, ameaçou. “Não serei refém de Serra”. O que significa lançar-se candidato ao Senado por Minas Gerais e, com isso, obrigar Serra a sair do armário e assumir, sem chance de fuga, a condição de candidato à presidência.

Serra não deixou por menos: afirmou que está cansado de “não-responder se é candidato à presidência” e, de tão irritado, é capaz de revelar sua decisão, quando chegar a hora, via Twitter, do qual virou assíduo navegante nas suas madrugadas notívagas. E disse tudo isso pelo Twitter, em menos de 140 caracteres.

E assim, com apenas 17% das intenções de voto, o governo entende que Dilma Rousseff vive o seu melhor momento como candidata, enquanto que, com o dobro disso, a oposição, nas palavras de Rodrigo Maia, “vive o pior dos mundos”. Só pode ser exagero, mas nos jornais de sexta-feira uma nota informava que o governo espera que Dilma cresça nas pesquisas e chegue a 20% em janeiro ou fevereiro, mas de maneira alguma se aproxime de 30%, porque isto poria Serra em fuga para uma candidatura à reeleição ao governo de São Paulo. E aí, menos por causa de Ciro Gomes do que pelo perfil “morde-assopra” de Aécio, a polarização buscada pelos governistas se tornaria mais difícil.

O “pior dos mundos” observado pelo presidente do DEM leva em consideração, por certo, as dificuldades que o candidato do PSDB pode ter justamente na região do país em que acredita ser capaz de assegurar a vitória: no Rio, o PSDB ficou sem palanque, desde que Gabeira “marinou”; em Minas, não será surpresa se o eleitorado rejeitar Serra, como desagravo a Aécio, caso ele seja derrotado no partido; e em São Paulo, onde Serra deve viver “o melhor dos mundos”, a maior ameaça pode estar em seu próprio palanque, na possível omissão de Geraldo Alckmin. Sem contar a hipótese de Ciro Gomes virar candidato a governador apenas para atazanar a vida de Serra.

A direção tucana já anunciou que vai cancelar as prévias, o que deveria ser bom para Serra, que sempre foi contra a eleição interna. Mas significa, também, que a escolha do candidato pode ser antecipada. Neste cenário nebuloso, não surpreende a conclusão do editorial publicado pelo Estado de S. Paulo: “A oposição patina na definição de seu candidato para 2010 e frequentemente se mostra intimidada pelos 80% de aprovação popular ao presidente e o renovado clima de otimismo com a economia. Apenas a imprensa parece fazer sombra a Lula.”

Faz mesmo?

Por Mário Marona, no blog Brasília Cofidencial

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