segunda-feira, 14 de julho de 2008

O jornalismo avestruz


Quarta-feira 9, 20 minutos antes de 1 da tarde. O banqueiro Daniel Dantas estava preso há 24 horas, acusado de diversos crimes, entre eles o de tentativa de corromper um delegado federal. Na rádio CBN, uma das tantas emissoras da família Marinho, a onipresente Miriam Leitão continua perplexa. Diz não entender o motivo da prisão, pois as acusações tratam de “coisas do passado” (ao que um gaiato jornalista, ao saber do argumento, comentou: “Ainda bem que a Polícia Federal não prende as pessoas por assuntos futuros, crimes que ainda nem foram cometidos”.) Ao fim do comentário, conforme registra Bob Fernandes no site Terra Magazine, Miriam deixa o estúdio e o colega Carlos Alberto Sardenberg, sem perceber que o microfone continua ligado, emenda: “Ela tá esquisita, não?”

Em sua coluna do mesmo dia em O Globo, Miriam Leitão já havia oferecido aos leitores sua visão dos acontecimentos, teses que viriam a ser encampadas pelo próprio jornal nos dias posteriores. Em resumo, a colunista questionava o fato de o banqueiro ser preso enquanto envolvidos em outros escândalos, como os do chamado mensalão, estavam soltos (ao que o mesmo gaiato jornalista interporia: se nem todos que deveriam apodrecer no xilindró estão na cadeia, então seria o caso de abrir a porta das celas, por questão de isonomia). Segundo a jornalista, Dantas não cometeu crimes (apesar das condenações em cortes internacionais), mas se meteu “em diversas confusões”.

O que se viu no resto da mídia não foi muito diferente. O necessário, mas superdimensionado debate sobre os possíveis excessos cometidos por agentes federais durante as prisões contrastou com a falta de questionamentos a respeito do prejulgamento do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, que antes de conceder o habeas corpus ao banqueiro criticou, em cadeia nacional de televisão, a ação da PF. As inúmeras referências às ligações de Dantas com o escândalo que se convencionou chamar de mensalão faziam sombra às parcas memórias de que o poder do dono do Opportunity criou raízes no processo de privatização dos anos 90. -Carta Capital num. 0504

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