Em sua primeira entrevista coletiva ontem, na Dinamarca, como chefe da delegação brasileira para discutir a questão das mudanças climáticas, a ministra Dilma Rousseff, foi categórica: “Se os maiores emissores de gases não colocarem as propostas de recursos na mesa, essa conta não vai fechar”. Dilma atacou a proposta de o Brasil participar do fundo mundial, como querem a União Europeia e os Estados Unidos. “Acho que o que está havendo aqui é uma inversão de responsabilidades, pois muitos países desenvolvidos, que têm a obrigação de colocar dinheiro em mitigação e adaptação às nações em desenvolvimento, estão sugerindo que a gente também coloque. Então, vamos ter que financiar a nós mesmos?”, questionou.
A ministra afirmou que o Brasil tem condições de investir em ações de mitigação locais (Namas) com dinheiro próprio, mas que, com o financiamento internacional, as coisas caminhariam em outra velocidade. “Não vamos dar um passo maior do que a perna. Tem algumas coisas que podemos fazer com dinheiro nosso, mas precisamos de financiamento. Não é dinheiro dado, é fonte para financiar, assim, ganharíamos mais fôlego. A convenção diz que é obrigação dos países desenvolvidos pagar. E quanto é o montante que estão dispostos a pagar? Isso não está sendo dito. Nós não vamos abrir mão de negociar, pois não podemos nos responsabilizar por emissões que nós não fizemos”, comentou.
Questionada sobre a briga entre Estados Unidos e China sobre quem vai colocar dinheiro na mesa, a ministra disse que o mundo é mais complexo que os dois países, e que a conferência também, para ficar focada nessa discussão bilateral. Os Estados Unidos são desenvolvidos e, por Kyoto (protocolo que não assinaram), teriam a obrigação de apresentar ajuda para as nações em crescimento. A China, por sua vez, é uma emergente, portanto, não está no grupo de países do Anexo 1. Os dois países passaram a semana, indiretamente, alfinetando um ao outro sobre a questão. Os EUA acham que as nações em desenvolvimento em melhores condições, como China e Brasil, devem dar sua contribuição.
Pela manhã, a ministra Dilma participou de uma reunião com cerca de 60 ministros e disse que representantes dos países emergentes estavam presentes, entre eles, as grandes nações africanas, grandes asiáticos, e os desenvolvidos, como Japão, Estados Unidos e União Europeia. “Falamos principalmente sobre duas coisas: as ações de mitigação — o que os países industrializados e os em desenvolvimento devem fazer — e a discussão sobre o financiamento. Além disso, claro, metas e critérios de cumprimento do que está sendo acordado. Kyoto tem responsabilidades comuns, com respeito às capacidades de cada nação.”
Para a ministra, os estoques de gases emitidos têm que ser baseados no valor do Produto Interno Bruto (PIB) per capita de cada país. “Nós temos uma emissão per capita muito baixa, temos grande parte de nossa base energética limpa, como as hidrelétricas, os biocombustíveis e assumimos ações voluntárias, com uma posição clara. Do outro lado, estão os desenvolvidos, que cresceram emitindo muito, ainda têm matriz fóssil e gastaram quase que 90% de seu potencial hídricoenergético. Seguimos firmes em relação às regras do jogo e, como país em desenvolvimento que somos, esse é o papel que nos cabe. O acordo construído tem que ser global e apostamos no melhor, de que vamos sair daqui com ele”, afirmou.
Consciência
O Brasil não tem obrigação de diminuir emissões, mas responsabilidade e consciência de que deve fazê-lo. Ao anunciar o programa de ações voluntárias de cortar emissões entre 36,1% e 38,9% até 2020, pode ganhar destaque em Copenhague. O governo se comprometeu, entre outras medidas, a reduzir em 80% o desmatamento na Amazônia e em 40% no cerrado — cortes de 669 milhões de CO² equivalente. Essa é outra questão que ganha peso esta semana na Dinamarca: a definição das regras para mensurar, verificar e reportar os cortes de emissão.
Tensão
Chegam esta semana a Copenhague cerca de 110 chefes de Estado e ministros. A previsão é de que quarta ou quinta-feira começem a ser definidas as novas regras do jogo. Enquanto isso, a tensão e o estado de alerta da polícia e de voluntários da Força Civil que estão nas ruas interagem com o clima de Natal que toma conta da cidade. A polícia dinamarquesa divulgou nota em que diz que deteve 968 pessoas no sábado. Ontem, outras 200 foram detidas em mais uma leva de protestos pela capital dinamarquesa.Correio
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